O DIREITO COMO OPORTUNIDADE DE NEGÓCIOS E DE BUSCA POR PROPÓSITO

Por Ana Paula Macedo Terra

A convite da coordenadora do núcleo jurídico da iniciativa denominada Mulheres in Rio (MIR), a advogada Christiane D´Elia, começo hoje a publicar mensalmente uma série de reflexões a respeito de temas contemporâneos ligados ao Direito e ao empreendedorismo vistos pelo ponto de vista feminino. 

 

A ideia é que criemos mensalmente e juntas um espaço qualificado para um diálogo aberto, franco, mas nada superficial, sobre o Direito e suas interações com a realidade da empreendedora carioca, de forma a, dentro do propósito da iniciativa denominada Mulheres in Rio, apoiar,com informações úteis, a jornada de outras profissionais em busca do seu aprimoramento pessoal e profissional.

 

Profissionalmente, o ano de 2020 vem sendo o meu ano para novos empreendimentos: além deste ambiente de difusão de idéias, passei a escrever semanalmente como colunista do site esportivo Lei em Campo (https://leiemcampo.com.br/category/colunas/ensaios-sobre-as-olimpiadas/) e iniciei um Mestrado, tudo isso em plena pandemia e enquanto inicio uma nova fase em meu relacionamento e um novo negócio.

 

Nada disso foi planejado, mas o imponderável novo normal me trouxe a disposição para desbravar uma capacidade até então esquecida e que me permitiu idealizar, coordenar e realizar esses novos projetos. A mim pareceu razoável que ao iniciar uma nova jornada – tal como esta série de textos periódicos ou um novo negócio – buscasse como fonte para minhas consultas ou apelos outras pessoas e iniciativas em quem confiar. 

 

Do mesmo modo, imagino que a empreendedora carioca gostaria de obter em outras iniciativas bem-sucedidas o conforto e a compreensão de estar no lugar e na hora certos e tirar seus sonhos do papel com a energia e disposição necessárias. Grávidas de idéias, ganhamos maior amplitude quando nos valemos de uma rede de cobertura sólida: debatendo ideias, entendendo perspectivas, pesquisando novos modos de olhar os mesmos fatos ao utilizar os óculos de outras realidades. É o que proponho para esta iniciativa mensal que, assim como o MIR, nasce do desejo de partilhar ideias e experiências e propor novos modos de olhar o Direito, agora como parceiro da mulher empreendedora.

 

Como sinônimo de tentar, de cultivar, o verbo empreender nos exige,em primeiro lugar, imaginar uma nova realidade. Contudo, mesmo para este exercício de imaginação é recomendável usar a lógica do escritor Ariano Suassuna para quem “o otimista é um bobo, o pessimista é um chato. Melhor ser realista esperançoso!”. Assim, como realistas e esperançosas, pensemos que para que o “cultivo” de boas ideias nos traga bons frutos e assegure a continuidade dos nossos negócios,essencial acrescer à imaginação, uma boa dose de planejamento.

 

Parte deste planejamento nos exigirá compreender as implicações de outros ramos profissionais em nossos negócios. Assim, ao arquitetar um novo empreendimento, devemos nos nutrir com informações que vão muito além do nosso plano de negócios: finanças, contabilidade, gestão de recursos humanos e tantos outros ramos nos servem de bons auxiliares e nos ajudam a pensar a realidade com a antevisão das tarefas a serem cumpridas. Dentro desses temas, cabe destaque aos de natureza jurídica.

 

Isso porque cabe especialmente ao Direito positivar a forma de organização e tratamento dos fatos sociais em determinado espaço e de acordo com o seu tempo.

 

Portanto, desde a simples formulação de seus contratos sociais ao abrir uma empresa ou ao tratar de questões relacionadas à propriedade intelectual, até o desejo de adequar o tratamento tributário do seu empreendimento, nós, empreendedoras, precisaremos nos valer de práticas e regras jurídicas vigentes.

 

Vale lembrar que, como espinha dorsal do nosso ordenamento jurídico a  Confederação Federal de 1988 consagra, em mais de um dispositivo, o princípio da livre iniciativa, que é a base do empreendedorismo nacional e que goza de garantia constitucional: tanto  no artigo 1º, inciso IV – como fundamento da República – quanto no artigo 170, caput  – onde estabelece que a ordem econômica deverá ser pautada pela valorização da livre iniciativa, uma das dimensões dos direitos fundamentais, posto que é um desdobramento da liberdade. Assim, ao Direito recorremos, ao menos,para não perder de vista a liberdade de empreender.

 

Do mesmo modo, nos valemos do Direito para entender como nos adaptarmos à nova lei geral de proteção de dados ou conhecer os benefícios advindos de um patrocínio a projetos esportivos, culturais ou sociais ou ainda para conhecer as formas de receber apoios governamentais, regras das quais poderão advir novas formas de negócios ou a sustentabilidade dos negócios já em curso.

 

Natural, portanto, que, ao pensarmos o empreendedorismo e sua capacidade de transformação econômica e social, seus desafios e suas vantagens, busquemos as leis de regência da matéria, de modo a identificarmos as métricas refletidas na legislação e que tornam nossos negócios íntegros, além de rentáveis.

 

Seja qual for o ramo de negócios, o retorno financeiro dos nossos investimentos certamente exigirá algum grau de previsão dos seus riscos, o que nos exigirá conhecer as regras aplicáveis ao ramo de atuação. Mais ainda no pós pandemia, quando – esperamos com fé! – nossa existência ganhará outros contornos e novos desafios. 

 

Muitas vezes visto como despesa, o Direito pode e deve ser pensado como parceiro da boa gestão: se aplicado de forma preventiva vale como um investimento e não mais como custo do negócio. 

 

Assim, por exemplo, é que, apenas interpretando institutos trazidos pelo Direito, podemos compreender como usar o compliance como aliado das mulheres no ambiente corporativo e como tratar temas ligados à integridade e à ética; compreender como a proteção de marcas pode auxiliar a evolução dos nossos negócios; obter fórmulas simplificadas para entender as regras da nova lei geral de proteção de dados e outras exigências modernas; usar a proteção do Direito para disseminação de sua marca ou mesmo entender que benefícios poderão advir da participação de sua empresa em licitações públicas, além de outros temas que prometo trazer a estes nossos encontros mensais.

 

Do mesmo modo como qualquer uma de nós projeta um futuro melhor e tenta contribuir para que ele ocorra a partir de nossas pequenas atitudes diárias, tais como lavar as mãos, usar máscaras e respeitar as regras civilizatórias comuns a todos os cidadãos, nós, empreendedoras projetamos nossa versão do mundo melhor através dos nossos esforços para criar interações humanas com mais propósito, dominando seus riscos e ampliando suas perspectivas. 

 

Caminhando ao lado do Direito e com ideias compartilhadas, a empreendedora certamente funde as suas aflições e encontra espaços para novas reflexões quanto ao alcance dos seus negócios e quanto à sua participação como cidadã. 

 

Resta, portanto, a lição de que não nos basta empreender, mas nos cabe, seguramente, realizar com propósito.

 

 

Ana Paula Macedo Terra : É sócia dos escritórios Camargos Advogados e Accioly Mendonça e Camargos Advogados, consultora em Direito Esportivo, Compliance, Políticas Públicas e Advocacy. Mestranda na PUCSP. Ocupou a função de gerente jurídica no Comitê Olímpico do Brasil de 2007 a 2020, atuando como advogada nas edições dos Jogos Olímpicos de Pequim 2008, Londres 2012 e Rio de Janeiro 2016. Membro da Sociedade Brasileira de Direito Desportivo e da Academia Nacional de Direito Desportivo. Escreve no site Lei em Campo na coluna “Ensaios sobre as Olimpíadas”.

 

Quer saber mais acesse: https://acciolymcamargos.com/

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