IDENTIDADE E EMPREENDEDORISMO - AS RESPOSTAS ESTÃO DENTRO DE NÓS.

Por: Tania Sales

Ser uma mulher nunca foi algo fácil; imagine ser uma mulher negra num país em que 3 a cada 4 mulheres assassinadas são negras. Enquanto as feministas brancas lutavam para poder trabalhar, muitas de nós já estavam correndo atrás de seu suado dinheiro, mesmo durante a infância. A nós foi dado o papel de guerreira incondicional, daquelas que lutam sozinhas com tanta garra. Segundo este papel, nossa maior conquista por muitas vezes é servir com maestria e lealdade exemplares, sempre sendo a coadjuvante.  E é com este plano de fundo que começo minha narrativa: ser uma mulher negra requer esforço e muita convicção, desde seus primeiros passos.

Assim como me foi ensinado na criação católica de meus pais, eu casei e tive filhos com vinte e poucos anos. É um período de nossas vidas em que as meninas com mais privilégios estão fazendo faculdade e intercâmbio, tendo promoções de emprego e se conhecendo. Não que eu me arrependa. A maternidade e o senso de responsabilidade foram cruciais para meu amadurecimento e a reentrada no ambiente de trabalho. Foi com meus 31 anos que finalmente comecei meu último capítulo da saga de CLT.

Mas, não me entenda errado: eu não queria aquilo. Foi difícil demais para eu aceitar deixar minha casa e meus filhos pequenos, que seriam criados por creches – coisa que eu nunca sonhei para eles – e dar segmento à minha vida profissional e futuramente acadêmica.

Sendo assim, pulando todo o drama de uma mãe de três crianças que renunciou a si para realizar o papel da mulher negra de dar assistência, finalmente aceitei uma proposta de emprego. Os primeiros dias foram aterrorizantes, não preciso nem mencionar, né? Mesmo já tendo trabalhado em uma contabilidade antes, os dias passavam e eu tentava com muito esforço captar tudo que me era ensinado, mesmo que na correria. Sou o tipo de pessoa que quando quer, fica até o final e faz acontecer. E eu precisava daquilo; para provar para minha família e para mim mesma que eu era capaz.

A pouca autoestima que eu tinha foi diminuindo, ao passo que eu me sentia desatualizada; mas eu não poderia desistir. Em poucos meses, estudei, fiz cursinho e comecei meu primeiro curso superior. Dali para frente, as responsabilidades só cresceram. Eu começava a perceber algo que é muito presente na maneira que enxergo as coisas hoje, e compartilho com muito carinho:

Todas as respostas estão dentro de você. Acredite no poder que temos, no simples ato de parar por alguns minutos fechar os olhos, respirar profundamente e esperar por um sinal, por uma resposta. Se tivéssemos ideia do poder que este ato tem, se nos permitíssemos um momento por dia, muitas angústias, sofrimentos, seriam evitados.

Não digo que eu me tornei completa ao entrar na faculdade. Eu tranquei, voltei, fiz outros cursos mais rápidos… A jornada foi longa até meu primeiro diploma, mas até meu primeiro cargo de responsabilidade, foi bem rápido. Em questão de meses eu recebi uma promoção que mudou completamente minha vida profissional.

Ainda seguindo meus princípios de sempre continuar firme através dos cursos e de contatos novos, minha autoestima, minha relação comigo mesma, começava uma curva negativa. Algo estava faltando. Algo dentro de mim amadureceu de uma forma que eu não enxergava por completo, mas alguns questionamentos surgiam. Foi num dia de reflexão que me olhei no espelho e me desafiei: é essa vida que você quer para você? Está feliz? É para isso que veio ao mundo? Qual seu propósito? E não, não obtive respostas.

Então sai em busca de conhecimento, além do prático. Desenvolvimento pessoal, emocional e profissional; dei o primeiro passo; buscar conhecimento em transição de carreira, depoimento de outros profissionais, rede de contatos e apoio. Eu começava algo chamado de transição de carreira. Levou uns dois anos para eu entender isso, e mais dois anos para começar a empreender. Nessa etapa, eu sonhei. Sonhei muito, sonhei alto. E eu escrevi muito também, exercício crucial para dar segmento e encorpar nossas ambições. Algo dentro de mim crescia exponencialmente.

Quando eu já completava catorze anos de empresa, a vontade de fazer meu próprio negócio acontecer já me deixava inquieta, ansiosa e com medo. O medo me dominava e o pensamento de escassez também. Medo do julgamento, medo de não dar certo, de colocar a vida das pessoas que mais me importava em risco; e a escassez e insegurança de pensar que, com tantos bons profissionais, por que alguém confiaria em uma profissional tão nova no mercado de contabilidade?

Aprendi algo intrínseco à vida de empreendedorismo: ser criticado e tratado como louco, é absolutamente normal. Pelo índice de desemprego assustador, é claro, mas principalmente porque esse sonho não é deles, é seu. Todos os detalhes cruciais para o funcionamento existem apenas na sua cabeça, e vão crescendo e se fortalecendo quanto mais você filtra as informações valiosas. Hoje eu me sinto impulsionada pelas críticas negativas e desencorajamentos.

Por fim, pedi as contas. Ninguém conseguia acreditar que eu, mulher negra, que sempre ajuda e sempre foi leal, estaria dando um passo tão egoísta. Colocando em risco a vida da minha família, desestabilizando nossa casa, para atender a um impulso. Parte de mim, acreditava nisso tudo; mas eu sabia de algo que ninguém mais poderia saber: eu nasci para isso.

Eu nasci para empreender e fazer da minha vida isso que eu estou construindo hoje com a minha empresa. Não importa o que você deseja na vida, se vier do seu coração e você achar que é certo, sempre siga em frente independente do que encontrar. Poucos serão encorajadores, principalmente porque a maioria foi educada para seguir a multidão, seguir o fluxo. Não fomos criados para questionar, tampouco para fazer diferente.

Te convido a refletir sobre sua vida, seu propósito, e encontrar as respostas dentro de você, permita-se ser quem você veio ser na vida. Lembre-se que você é um ser único e nada se compara a realização e plenitude.

A plenitude deveria ser a morada de todos nós, o lugar onde todos deveriam chegar no final do dia.

Os primeiros meses da minha empresa foram bem angustiantes. Me perguntava se fiz a escolha certa, e se eu teria algum retorno. Andando de ônibus e caminhando para as reuniões, eu não poderia imaginar que teria a confiança que tenho hoje, com os clientes e os investimentos que conquistei e preservei tanto.

Empreender trouxe a exata convicção do meu propósito de vida, do meu lugar no mundo como ser humano, como pessoa e como mulher. Empreender não é só abrir uma empresa, não é ter um negócio e sim ter uma ideia inovadora, resolver um problema, implementar, superar desafios, aprender uma nova prática, ter novas ideias, de uma forma econômica, funcional e prática.

Podemos empreender como professores, como alunos, como funcionários, mães e pais, médicos ou empresários. O essencial é tornar a vida das pessoas melhor.

Se eu puder dar uma dica, não empreenda por dinheiro. O dinheiro é consequência de um bom trabalho – disciplina, foco, investimentos, treinos e muito mais. A melhor ideia vem das paixões, das suas próprias competências e da análise do mercado. Seja honesto com você e faça aquilo que você sabe que faz bem, que o dinheiro vem.

Resumidamente, oriento a todas e todos que leia esta autoanálise para se questionarem, para fazer a viagem que todos um dia devemos fazer, tão longa e gratificante: a viagem do autoconhecimento!

 

 

 

 

TANIA SALES: CEO da TAPS Consultoria, contabilista especializada em legalização de empresas, graduada em Gestão Financeira e gestão de processos, MBA em Gestão Empresarial  e Especialização em Liderança Corporativa pela FGV. Membro da Rede Mulheres in Rio e RME.

 

Adoro dar mentoria para novos empreendedores!

 

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