30 ANOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Por Roberta Faria

A semente de proteção ao cidadão nas relações de consumo foi lançada com o advento da Constituição da República Federativa no Brasil de 1988, no artigo 5, XXXII, que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”. 

No dia 11 de setembro de 1990, foi promulgada a lei 8.078, o famoso Código de Defesa do Consumidor. Que este ano completou 30 anos. Parabéns, consumidor!

As normas trazidas pelo conjunto de leis consumeristas formaram alicerces fortes para a construção da cidadania em nosso país e um grande avanço no nosso ordenamento jurídico com princípios modernos de defesa da sociedade, instituindo mecanismos céleres e capazes de proteção e defesa do consumidor. Na realidade, ocasionou uma transformação na mentalidade da sociedade Brasileira com relação às relações de consumo.

Sem sombra de dúvidas é uma das leis mais importantes do país, pois todos somos consumidores. Várias operações do cotidiano configuram relações de consumo, exemplifico desde a simples compra de um cafezinho até a aquisição de um veículo automotor na concessionária. Se pensarmos, consumimos a todo momento tanto produtos como serviços. Por este motivo, devemos ter conhecimento de nossos direitos.

Antes da promulgação do CDC, os problemas entre consumidores e fornecedores de bens e serviços eram solucionados pelo Código Civil, que evidentemente não possuía a especificidade da lei própria.

Vejamos, o conceito legal de Consumidor, “é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”, conforme alude o artigo 2º. O parágrafo único, do próprio artigo, “equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”.

A definição legal de consumidor complementa-se com outros 2 artigos. O artigo 17, que preceitua: “Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”, e, ainda, o artigo 29: “Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”.

Explicarei através de exemplo o termo utilizado “destinatário final”. Se uma pessoa compra garrafas de água mineral para servir em uma confraternização, todos que beberem serão considerados consumidores. Portanto, se uma pessoa jurídica ou física adquire as mesmas garrafas de água mineral, como intermediária, para revendê-las, a relação jurídica não será regida pela Lei 8.078/90.

Já o significado de fornecedor, “é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”, faz menção o artigo 3.

É de grande destaque a característica da habitualidade ou regularidade do fornecedor em suas atividades, gerando lucro ou não,para que se possa definir se há ou não relação de consumo de seus produtos ou serviços. Visto que, temos a possibilidade da venda de um produto realizada por um comerciante não enquadrar-se em uma relação de consumo regida pelo Código de Defesa do Consumidor. Por exemplo, a venda de um refrigerador por uma lanchonete para adquirir outro mais moderno. Mesmo que o comprador seja o “destinatário final”, a relação não será regulada pela legislação consumerista, pelo fato da lanchonete não ser considerada fornecedora.

Caso equivalente, é quando uma pessoa física vende seu computador usado. Pelo vendedor não possuir a característica da habitualidade, não existe fornecedor, portanto não há relação jurídica de consumo. Será um ato regulado pela legislação comum.

No que concerne à pessoa física, se desenvolver atividade eventual ou costumeira de comercialização de produtos ou prestação de serviços, mesmo sem ser pessoa jurídica ou ter CNPJ, será qualificada como fornecedor. Como exemplo temos, as vendedoras de cosméticos, de lingerie, doces, bijuterias e, também, com relação aos prestadores de serviços, as massagistas, depiladoras, manicure, eletricista dentre outros.

O desequilíbrio entre consumidor e fornecedor é notório pelo fato do consumidor não ter gerência sobre a cadeia de produção.O que o torna leigo dos labirintos da relação de consumo e sujeito às regras dos proprietários dos bens de produção, além de ser frágil contratual e, em tese, economicamente.

A lei consumerista em seu artigo. 4.º, I, reconheceu a fragilidade do consumidor na relação perante o fornecedor. O princípio da vulnerabilidade é aquele que define o consumidor como a parte mais fraca da relação, independentemente de suas características pessoais. Além, de prever o instituto da inversão do ônus da prova em benefício ao consumidor, no artigo 6º, VIII.

A visão protetiva do Código de defesa do Consumidor visa manter ou restituir o equilíbrio contratual nas relações estabelecidas entre fornecedor e consumidor.

 

A jurisprudência do STJ na visão do Ministro Humberto Martins consumou o conceito em diversos julgados:

“a) O critério da vulnerabilidade tem servido para atenuar a teoria finalista para se “autorizar a incidência  do  Código  de  Defesa  do  Consumidor nas hipóteses  em  que  a  parte (pessoa física ou jurídica), embora não seja  tecnicamente  a  destinatária  final do produto ou serviço, se apresenta  em  situação de vulnerabilidade”. STJ. AgRg no AREsp 837.871/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 26/04/2016, DJe 29/04/2016

  1. b) Não é possível admitir a vulnerabilidade de uma pessoa jurídica que “não ostenta a condição de consumidora final”, ao exemplo de “um laboratório clínico que adquiriu os produtos para insumo de sua atividade comercial”. AgRg no Ag 1299116/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 01/03/2016, DJe 10/03/2016.
  2. c) O princípio da vulnerabilidade tem por objetivo assegurar a “igualdade formal-material aos sujeitos da relação jurídica de consumo, o que não quer dizer compactuar com exageros”. REsp 586.316/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/04/2007, DJe 19/03/2009.
  3. d) A vulnerabilidade, conforme entendimento doutrinário, pode-se apresentar sob três modalidades: “técnica (ausência de conhecimento específico acerca do produto ou serviço objeto de consumo), jurídica (falta de conhecimento jurídico, contábil ou econômico e de seus reflexos na relação de consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica do consumidor o coloca em pé de desigualdade frente ao fornecedor). Mais recentemente, tem se incluído também a vulnerabilidade informacional (dados insuficientes sobre o produto ou serviço capazes de influenciar no processo decisório de compra)”. REsp 1195642/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 13/11/2012, DJe 21/11/2012.”

De nada adianta existir uma lei e o cidadão não ter ciência. Ser consumidor é realizar um exercício de cidadania, portanto é de suma importância o conhecimento e a informação dos seus direitos e deveres como consumidor.

Conheça, pratique e exerça seus direitos! Viva Código de Defesa do Consumidor!

 

 

 

Roberta Araujo Faria é advogada. Especialista em Direito empresarial, atua ajudando empresas e pessoas físicas com soluções jurídicas que contribuam com o desenvolvimento e o sucesso de seus parceiros.


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